EXPEDICIÓN GUARANI 2017 - la busca por el Full Course

DIOGO DE SORDI -  EQUIPE NOSSA VIDA / BOA
2º Lugar na Expedição Guarani • Etapa do circuito mundial de corrida de aventura / ARWS

Encontro de vontades e sentidos

Em 2015 corri a Expedição Guarani com a equipe argentina Trail del Viento e conseguimos um excelente 4° lugar. Uma prova desafiadora, muito bem organizada e a inscrição mais barata do circuito mundial.
Este ano fui convidado por Elio, paraguaio muito buena onda, mas que infelizmente não pode mais correr por problemas pessoais. Com as passagens compradas eu precisava de outra equipe. Não consegui ninguém em Brasília e isso me preocupava, mas tudo se resolveu em poucos minutos no dia 31 de dezembro. Me dirigia para uma fazenda na trijunção (limite Bahia/Minas/Goiás) quando Jonas Junckes respondeu minha mensagem pelo Facebook. Havíamos disputado em 2015 a terceira colocação e ele havia me vencido, navegando também para uma equipe argentina. Troquei a direção com a minha esposa e rapidamente, antes que o sinal do celular acabasse, já tínhamos um time. Jonas me falou que, juntamente com Pedro Pinheiro, estavam procurando outros integrantes. Enviei o convite para Leticia Morro, paraguaia que já integrava a equipe com Elio, que aceitou com entusiasmo repetindo inúmeras vezes: “Solo quiero el full Course. Full Course!” Mesmo a milhares de quilômetros, passamos muito felizes aquele réveillon. A equipe Nossa Vida/BOA estava formada.

Pré Prova

Na semana seguinte Leti e sua amiga Pati, que ainda terminaria correndo a Exp. Guarani com a outra equipe brasileira - Tubaina, foram para Florianópolis de férias e realizaram longos treinos de trekking e Canoagem com Jonas e Pedro. Parecia que já haviam combinado tudo.
Enquanto isso meus treinos seguiam forte até que sofri um acidente que poderia ter sido grave. Uma fechada de uma carro me jogou no asfalto. Passei duas semanas sem treinar canoagem.
Antes mesmo que a equipe fosse formada, eu já havia planejado ir ao Paraguai no final de janeiro correr uma prova mais curta de 120 km com Elio e aproveitar para buscar uma bike. Jonas e Pedro decidiram uma semana antes que iriam dirigir até Asunción e correr a prova. Uma ótima oportunidade para entrosar a equipe. Nos encontramos no QG Central (casa da Letícia em Asunción) e conversamos bastante. No outro dia largamos muito fortes e eu estava como uma criança, empolgado com minha nova MTB. Após um pedal curto, remamos bem por 7 km e saímos sozinhos do lago. No trekking de 25 km cruzamos algumas vezes com a equipe de Urtzi (navegador da equipe Columbia vidaraid e mapeador da Exp. Guarani). Conseguimos abrir 30 min do segundo colocado no final da canoagem. No pedal final nos complicamos porque o mapa estava totalmente desatualizado e em outra escala, o que demoramos a descobrir, já que não havia nada escrito neles. Depois os problemas pioraram. Jonas e Pedro sentiram desidratação nesse pedal e precisamos parar para recuperar. Mesmo com todos os problemas terminamos a prova em 3º lugar. Era preciso melhorar muito mas eu fiquei satisfeito porque ainda tínhamos 1 mês.
Tudo corria bem até que, faltando uns 5 dias para a largada, Jonas me liga pra falar que estava há mais de 1 semana com diarreia forte e que não tinha condições de correr a prova. Eu e Pedro começamos a procurar algum substituto. Todos que pensamos ter a cara da equipe não conseguiram desmarcar seus compromissos pessoais faltando tão pouco tempo. No último momento para partir, Pedro me ligou dizendo que não restava outra escolha e que iria passar na casa do Jonas e levá-lo para a prova. Eu tinha certeza que poderíamos iniciar mais lentos, mas que até o metade da prova ele já estaria bom. O que eu não sabia é que iria se sair tão bem.

A Prova

Cheguei já no sábado de manhã, 2 dias para a largada, e realizamos o check dos equipamentos e trâmites finais. Fomos alojados em uma casa incrível beira lago com piscina e toda estrutura. No domingo, churrasco típico para relaxar a tensão da largada enquanto organizávamos os últimos detalhes. Na nossa casa só havia mais 1 equipe, mas em outras o big brother chegava a ter 5 equipes por casa.
Na segunda-feira antes das 6 horas, enquanto Letícia e Pedro preparavam os caiaques, eu e Jonas analisamos os mapas. Pouco tempo para 20 mapas e a conclusão era a mesma, de que os trekkings decidiriam a prova. Largamos às 8 horas para uma canoagem de 55 km. O primeiro trecho no lago era tranquilo e, apesar dos barcos sitontop, com fundo liso, parecerem ducks, já conseguimos uma boa colocação. Após 2 PCs entramos no rio salado que era estreito e corria bem. Após aproximadamente 35 km remando, senti meu ombro, da antiga lesão do atropelamento. Foi uma dor quase insuportável. Pedi para trocar com o Jonas que assumiu o leme do meu barco. Remamos no mesmo ritmo e finalizando em 4° lugar aquela canoagem.
Sabíamos que havíamos novamente começado muito forte e que poderíamos pagar por isso. O maçarico estava no máximo (sensação térmica de 45°C) e parecíamos bem localizados, mas as referências foram sumindo e passamos colados no PC. Perdemos a noção da velocidade e quanto estávamos fora do azimute. Até que encontramos o rio Salado, só nesse momento percebemos o erro. Uma decepção porque havíamos começado tão bem. Foi preciso sentar para entender nosso erro e encontrarmos uma solução: contornar por uma pasto ao invés de rasgar todo charco de volta. Poucas horas depois encontramos o PC e várias equipes perdidas no início da noite. Havíamos perdido a confiança e a energia. Saímos em busca do PC5, que exigiam maior concentração. Traçamos o azimute e contei passos, o encontramos rápido. Logo achamos o PC 6 e fomos acertando e retomando também a energia. Daí pra frente a navegação fluiu. Saímos para uma pernada de 89 km de bike. O calor castigava e depois da metade do pedal tínhamos que parar a cada 10 km para pegar água e molhar a cabeça. Ultrapassamos e fomos ultrapassados pelas mesmas equipes que também se arrastavam. Letícia não sentia o calor e até se irritava com nossa fraqueza, mas logo ela viu que todas as equipes precisavam parar com tanto calor. Eu sentia uma forte ardência nos olhos que piorava a cada hora. Por sorte eu tinha um colírio no meu kit pessoal que já não estava adiantando muito. Passamos por um lugar incrível com várias formações rochosas e muitas vias de escalada, onde realizamos um rappel com as bikes nas costas.
Paramos em uma venda para uma coca gelada e vi um óculos de sol velho no balcão. O senhor não queria vender e no desespero paguei 20.000 guaranis. Uma das lentes caiu em menos de 5 km dali. Chegamos até bem colocados na transição mas precisávamos dormir. Enfrentar um trekking de 55 km virando a 2a noite não seria uma boa ideia e sabíamos que esse era o crux da prova. Tive que ficar 30 min na ambulância limpando e recuperando da infecção nos olhos. Pedro e Jonas foram para piscina. Preparei minha mochila, comi e fui me juntar aos outros que dormiam na beira da piscina. Não foi uma boa ideia. O barulho e o calor não me deixaram dormir.
Quando saímos para o trekking já era noite e quase todas as equipes já tinham iniciado essa pernada. Com 15 minutos minha camiseta limpa estava completamente encharcada de suor e caminhamos em ritmo bom mas sem forçar. Eu e Jonas discutimos sobre a estimativa de velocidade e opções onde poderíamos arriscar algum shortcut, o que quase não fizemos. Os 4 primeiros PCs não tivemos muita dificuldade em encontrar. Só restavam 15 PCs nesse trekking. Estávamos confiantes que esse era o caminho certo até que a trilha tomou uma direção ruim. Chegamos em uma fazenda onde a trilha não seguia. Cansados, decidimos dormir uns 20 minutos. Com a cabeça fresca resolvemos margear o rio mesmo sem trilha. Embora nós tenhamos perdido um pouco de tempo, sabíamos onde estávamos. Foi um PC que deu trabalho e várias equipes passavam de um lado para o outro sem encontrá-lo. Seguimos até uma cascata (PC27), logo após algumas picadas de vespa no PC26. Perdemos um alguns minutos no PC28, um dos mais escondidos, e para o seguinte, decidimos ser mais conservadores e tomar o maior caminho, descendo e subindo a serra. Tomamos banho de rio e sorvete e no PC 30 descobrimos que havíamos feito uma ótima estratégia.
Os checkpoints seguintes foram belíssimas cachoeiras que refrescaram nosso calor. Daí para frente o trekking consistia em escaladas de pequenos cerros. No Mbatoví chegamos a noite e encontramos a equipe Euskat. Subimos por uma parte perigosa. Eu carregava a mochila do Pedro, que sofria com os pés machucados, mas tive que entregá-la porque não conseguia escalar as pedras com 2 mochilas. Quando me dei conta estava no topo de uma via de escalada com os grampos muito novos. Ventava muito e foi bem tenso pular de pedra em pedra até o PC no topo. Não perdemos tempo e já buscamos o próximo PC, uma bela árvore retorcida dentro da floresta. Paramos cansados no pé do penúltimo cerro. Perto das 4 horas da manhã, depois de vários dias de muito calor fazia um vento de abrir os braços. Estavámos bem cansados e terminava a 2a noite naquele mesmo trekking. Decidimos dormir e foi o sonho dos deuses. Acordamos revigorados com sol nascendo e enquanto guardávamos nossas mantas térmicas, uma equipe entra na trilha. Quando decidimos dormir no pasto, ao lado das vacas, não percebemos que paramos ao lado da subida. Aceleramos e alcançamos a equipe Trail del Vento que perto do topo desviou para esquerda enquanto nós atacamos o PC primeiro. Corremos por uma trilha e logo entramos na mata. Jonas bem focado encontrou a trilha e logo achei uma embalagem de comida liofilizada no chão que guardei com meu lixo. Descemos muito forte e encontramos um touro na mata qua assustou e correu mostrando a trilha certa. Pegamos água no penúltimo PC e subimos o último cerro (Jhú) escalando grandes blocos e segurando em raízes. O último PC do trekking ficava em um mirante que mostrava o AT e a cidade de Paraguari. Na descida combinamos que independente da colocação iriamos focar na nossa linha do tempo para alcançar o Full Course. Quando chegamos no AT éramos 3º e o 2º colocado não estava muito distante. Estávamos descansados e motivados para pedalar. Mas essa longa pernada de bike com mais de 100 km começava com 12 km no trilho de trem abandonado e completamente fechado de espinhos. Em 1 hora conseguimos andar 1km. Desesperador, mas era a única opção. Em alguns lugares era necessário engatinhar para passar e puxar a bike e em outros, quando conseguimos subir na bike, haviam muitas pedras e pontes quebradas que tínhamos que nos equilibrar para passar. Em um córrego desses encontramos com a equipe espanhola e um integrante estava deitado no chão se recuperando. Após 4 horas, 4 pneus furados e as canelas todas cortadas, vencemos a trilha e começamos a pedalar. O ritmo foi forte e o calor já não perturbava tanto. Paramos pouco e Jonas fez uma navegação fora de série. O pelote funcionou e algumas vezes não consegui fazer o backup pedindo para me colocar novamente no mapa. Essa pernada passou rápido e chegamos na entrada da canoagem cansados e ao mesmo tempo querendo manter o ritmo, pois não sabíamos qual era nossa vantagem dos que vinham em seguida.
Perdemos um pouco de tempo arrumando os barcos, mas isso foi bom porque eu e Leticia viramos logo no começo. Sorte que as mochilas estavam clipadas. Perdemos somente algumas garrafas de água. O rio era bem estreito e corria forte. Na primeira hora usamos mais as mãos para levantar os galhos do que para remar. A mata era tão fechada que, em alguns momentos, precisávamos observar para onde a água corria para continuar seguindo o fluxo. Me recordo que de repente perdemos o fluxo e ficamos presos num remanso. Não encontramos para onde o rio seguia. Nós quatro estávamos alucinados de sono. Agora lembrando parece engraçado, ninguém se entendia e paramos para um cochilo. Não conseguimos dormir porque vários tipos de insetos estavam nos mordendo. Voltamos rio acima até que achamos a água correndo para dentro das árvores. A mata foi abrindo e conseguimos remar. Eu estava preocupado com meu ombro que não reclamou e então segui constante. O sol nasceu num bonito dia e em algumas dezenas de vezes naquele rio, com milhares de meandros, pensamos estar passando no mesmo lugar. Eu não queria parar e Jonas, Pedro e Letícia alternaram o sono. Conectamos os barcos e enquanto dois dormiam, dois remavam. Leticia me oferecia comida na boca e não parei mais. Foram mais de 14 horas remando sem parar. Passamos por uma ponte e vimos Togumi e Martim (fotógrafos) e pensamos que estávamos perto do AT e, ainda, que as outras equipes se aproximavam. Ainda faltavam algumas horas e, mesmo assim, tentamos aumentar o ritmo. Chegamos na transição e eu estava destruído e sem voz. Na mão esquerda 8 bolhas. Só faltava a menor pernada de bike (72 km). Comemos uma ótima refeição oferecida nas transições e saímos fortes, ignorando a trepidação, numa longa subida estilo paris-roubaix. Essa noite o sono bateu e consegui sonhar na bike. Por sorte acordei desclipando o pedal e correndo por cima da bike que ficou lá atrás. Tapa na cara, água na nuca e Full Course!! Um falava para o outro. Não encontramos a trilha certa e enfrentamos um charco empurrando a bike a talvez 0,5 km/h. Eu só tentava refazer os cálculos da nossa linha do tempo, mas não conseguia calcular. Pedro e Leticia não se entendiam mais e precisavam de intérprete. Então observamos algumas luzes vindo rápido e percebemos que a trilha estava do nosso lado. Cruzamos com algumas equipes cortadas, que não haviam feito a canoagem de 90 km. Cansados erramos um pouco a navegação e já estávamos irritados. Para piorar minha corrente estourou. Pedro fez o reparo como um pitstop da Ferrari e na sequência o pedal da Leticia quebrou. Nesse momento eu tinha certeza que a Columbia VidaRaid já havia nos passado por algum outro caminho que erramos. Quando entramos no country club faltava muito pouco e sabíamos que havíamos conseguido o Full Course. No entanto, não imaginávamos ter conseguido uma 2ª colocação na etapa Sulamericana do Circuito Mundial de Corrida de Aventura (ARWS), somente 10 minutos na frente da atual 2ª colocada no ranking mundial. Foi emocionante! Leticia nao parava de falar: - Full course! Pedro não conteve o merecido choro. Comemoramos muito nesses dias, mas meu choro veio quando cheguei no hotel e liguei pra casa. 10 dias longe das minhas meninas e quando Yara me colocou para falar com a pequena que estava fazendo 6 meses não me aguentei. A voz não saiu.
Tenho muito que agradecer meus companheiros de equipe. Fomos verdadeiros guerreiros e superamos não só cansaço, calor, sono, mas também as dificuldades de se correr em uma equipe que pouco se conhecia e colocar as diferenças atrás dos objetivos. Merecemos!
Gracias Gustavo y Urtzi por tan fantástica organización y desafiadora carrera!
Obrigado meus treinadores da Oficina Multisport, Gui, Cami e Arnaldo que além de me ajudarem na preparação física, me orientam na preparação da logística de prova.
Meu guru Jk ( da Fisioterapia Inovar) que conseguiu matar minhas panes antes da prova.
Meus personals coach indoor Vini, Gilmar e Vitor da Fitmove Centro de Treinamento.
Meu mestre-mecânico Leandro e o apoio imensurável do Marcão da Cycling Bike Club.
Meu parceirão Pedro da BOA e os companheiros de treinos da Caliandra multisport. Enricão e Leandrinho ajudaram muito no pedal. Os companheiros de treino do Torresmo Raid e Oficina Multisport e ao meu amor que não poupou esforços em me ajudar na logística para chegar no Paraguai e só precisar largar.

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